O Concreto no tempo: o passado, presente e futuro do material mais usado na construção civil em todo o mundo.

Escrito por: André Melo

O concreto é um material fantástico observado em basicamente qualquer lugar em que se pise atualmente. Esse material extremamente versátil dentro da construção civil é composto por uma receita simples contendo agregados, algum ligante e água, e caminha junto com a humanidade há eras. De fato, as obras à base de concreto foram utilizadas já na antiguidade em civilizações como o Egito Antigo, em suas pirâmides, e, principalmente, o Império Romano, onde uma receita especial conferiu ao concreto propriedades inusitadas mas que, infelizmente, seriam perdidas por algumas centenas de anos.

É claro que, como se pode observar, o concreto voltou às nossas vidas com força, constituindo uma potência na construção civil contemporânea, mas será que aprendemos tudo o que podíamos com os romanos? Quais são os principais dilemas atuais, envolvendo o concreto, para os engenheiros? E o que o futuro reserva para o alicerce da sociedade atual? Essas são todas perguntas que inspiram uma boa avaliação histórica e prospectiva do material.

Imagem 01 – Concreto

Fonte: Portal do Concreto (2010)

O Concreto no Passado

Por mais que muitas civilizações antigas tenham feito proveito do concreto, até mesmo muito antes dos romanos, o Império Romano foi o primeiro a produzi-lo de forma sistemática, se aproveitando de ter uma abundância de territórios e, consequentemente, de recursos naturais. Um exemplo da grandiosidade desse povo na construção civil foram as obras faraônicas – ou imperatônicas, talvez – que ele foi capaz de erguer, como o Coliseu e o Panteão – dono do maior domo de concreto não reforçado já feito, até os dias de hoje.

Imagem 02 – O Panteão

Fonte: Viva Decora (2021)

O segredo disso? O Concreto Romano. Em um conjunto de grande perspicácia e, como sempre observado na história humana, uma boa pitada de sorte, os romanos moldaram uma receita de concreto baseada no uso de Pozolana como agregado. A Pozolana é uma rocha vulcânica encontrada na região de Pozzuoli, ao pé do monte Vesúvio, que, em mistura com calcário aquecido, formava um Concreto Hidráulico, que tem esse nome pela distinta propriedade de ganhar resistência em contato com a água do mar, formando uma estrutura rochosa altamente confiável.

De posse dessa propriedade, os romanos embasaram um vasto e muito desenvolvido império que pavimentou diversas estradas, aquedutos, portos e edifícios utilizando concreto, o qual resiste em várias dessas estruturas, até os dias de hoje, 2000 anos depois de sua construção. Diversos povos ao longo das eras puderam vislumbrar as maravilhas arquitetônicas dos romanos, que encontraram, em sua grande capacidade de suportar compressão, uma garantia de plena longevidade. Longevidade, essa, que superou, inclusive, a da transcrição de sua receita.

O fato é que com a queda do império romano, muita literatura se perdeu, o que levou, inclusive, a receita do seu concreto a permanecer um segredo por muito tempo. Felizmente, no Século XVI, em meio à reforma protestante, foi-se encontrada e traduzida a obra De Architectura, de Vitrúvio – arquiteto e escritor romano -, manuscrito que continha, dentre outras coisas, a receita básica do concreto, que seria lentamente reintroduzido na sociedade moderna a medida que se ia entendendo o que ele podia nos proporcionar.

Imagem 03 – De Architectura

Fonte: Wikipedia (2020)

O Concreto no Presente

Dessa forma, se daria apenas no Século XVIII, em meio à Primeira Revolução Industrial, a reinvenção do concreto hidráulico, com uma mistura de argila e calcário na fabricação de um novo cimento, o mais comumente encontrado nos dias de hoje, chamado de Cimento Portland. A receita não era a mesma usada na antiguidade, assim, o concreto não era exatamente o mesmo e, portanto, a resistência conferida não foi a mesma com a qual os romanos se acostumaram. Porém, foi na vigência desse novo cimento que se desenvolveu uma solução para uma importante imperfeição do concreto romano, a resistência à tração.

Afinal, para a construção de prédios e pontes exorbitantes como as que vemos nos dias de hoje, é importante que as estruturas sejam capazes de resistir às mais diversas forças que se apliquem nelas. Contudo, para as forças deformadoras de tração, o concreto romano não era bem um especialista – motivo pelo qual os arranha céus à época não passavam de três andares. Para sanar tal deficiência foi que se moldou, já na contemporaneidade, o Concreto Armado.

Imagem 04 – Concreto armado

Fonte: Wikipedia (2022)

O Concreto Armado se chama assim pela presença de uma armação de metal introduzida dentro do corpo de concreto. O concreto protege o esqueleto metálico da ação corrosiva do ar e da água e este, por sua vez, confere mais resistência estrutural a deformações, capacitando a formação de estruturas como pontes aéreas, túneis e prédios de alturas quilométricas, que moldam as paisagens das grandes cidades do mundo contemporâneo.

De fato, a importância do concreto tomou tamanha proporção na construção civil, que se tornou o material, em todo o mundo, mais utilizado – atrás apenas da água, que compõe sua receita. Atualmente, há 3 toneladas de concreto para cada pessoa, no mundo, e sua soberania em relação aos outros materiais é observada fortemente na China, onde, segundo comparação apontada por Bill Gates em seu blog, em 2014, utilizava, em três anos, mais concreto do que os Estados Unidos havia utilizado em todo o Século XX.

Imagem 05 – A nova potência do concreto mundial

Fonte: Forbes (2014)

Acontece que a produção do concreto atual, diferentemente do concreto romano tem alguns problemas que devem ser considerados. Um deles é na produção da Cal Virgem (CaO), matéria prima para o Cimento Portland, que é produzida a partir da queima do calcário (CaCO3). Este processo não só libera o CO2 que se desprende do calcário para a atmosfera, como também é feito em temperaturas extremamente altas – da ordem de 1450 ºC -, o que demanda muita energia, normalmente vinda de combustíveis fósseis. Tal processo abarca, atualmente, cerca de 8% da emissão de gás carbônico industrial no mundo.

Outro ponto, ainda, é o alto custo de manutenção do concreto armado que, diferentemente do concreto romano – o qual perdura em estruturas milenares – é feito para durar de 50 a 120 anos e requer reparos constantes – e caros. O principal motivo disso é que o concreto atual, em constante exposição a fatores naturais, se deteriora, criando pequenas fendas que dão acesso para a água, o oxigênio e o gás carbônico entrarem em contato com a armação. Quando há esse encontro, a armação não só se fragiliza, como incha, o que ajuda a quebrar ainda mais a estrutura rochosa em volta de si. A preocupação em torno do fato é justificada, mas a supervisão e a manutenção dos construtos custa muito dinheiro, que nem sempre os responsáveis estão dispostos a gastar.

Imagem 06 – Concreto armado deteriorado

Fonte: Mapa da Obra (2014)

O Concreto no Futuro

Como resolver esses problemas? Bom, talvez um bom começo seria desvendar os mistérios do concreto hidráulico romano, assim como instalar em larga escala o uso de microbiologia nos projetos arquitetônicos daqui em diante.

A primeira alternativa continua desafiando a capacidade dos nossos cientistas, mesmo nos dias de hoje. Afinal, foi somente em meados de 2013 que uma equipe de pesquisadores da Universidade da Califórnia, em Berkeley, conseguiu realizar uma análise mais a fundo do material, demonstrando a fórmula para uma estrutura muito mais durável que a atual. As pesquisas sobre o assunto embasaram o uso – bastante promissor – da pozolana como substituto, mais sustentável e extremamente abundante, do Cimento Portland, porém, elas ainda estão em andamento e uma troca significante entre os aglomerantes parece uma realidade um pouco distante.

Já a segunda alternativa diz respeito à inserção de bactérias na mistura do cimento, iniciativa responsável pela criação do Bioconcreto, um tipo de concreto auto-curável. Essa característica é provida pela produção de calcário vista em algumas espécies bacterianas que, inseridas na mistura do concreto, se ativariam no contato com a atmosfera (em caso de fissuras), e as permitiria se alimentar e preencher os vazios, retornando posteriormente a um estado inativo. Tal iniciativa é extremamente inovadora e se mostra relativamente acessível para um futuro próximo, diminuindo os custos de supervisão e manutenção das estruturas.

Imagem 07 – Bioconcreto

Fonte: Ciclo Orgânico (2022)

Uma coisa é certa, o novo sempre vem e, à medida que novas tecnologias surgirão, o concreto com certeza vai evoluir. O importante é nunca ter medo de inovar, mesmo para ativos que se mostraram, ao longo de milênios, tão concretos!

Referências

Abreu, B. G., Araújo, C. E. S. B. de, Órfão, R. B., & Amarante, M. dos S. (2019). BIOCONCRETO. Diálogos Interdisciplinares, 8(2), 45–55. https://revistas.brazcubas.br/index.php/dialogos/article/view/686

Lima, S. F., Lima, C. I. V., Coutinho, C. O. D., Azevedo, G. G. C., Barros, T. Y. G., & Tauber, T. C. (2014). Concreto e suas inovações. Caderno de Graduação – Ciências Exatas E Tecnológicas – UNIT – ALAGOAS, 1(1), 31–40. https://periodicos.set.edu.br/fitsexatas/article/view/1285/755

McCarthy, N. (n.d.). China Used More Concrete In 3 Years Than The U.S. Used In The Entire 20th Century [Infographic]. Forbes. Retrieved April 7, 2023, from https://www.forbes.com/sites/niallmccarthy/2014/12/05/china-used-more-concrete-in-3-years-than-the-u-s-used-in-the-entire-20th-century-infographic/?sh=5f5fba134131

Yang, S. (2013, June 4). To improve today’s concrete, do as the Romans did. Berkeley News. https://news.berkeley.edu/2013/06/04/roman-concrete/

A História do Concreto – Hembrafer. (n.d.). Hembrafer.com.br. Retrieved April 7, 2023, from https://hembrafer.com.br/a-historia-do-concreto/#:~:text=O%20primeiro%20fato%20registrado%20aponta

Por que o concreto romano é mais resistente do que o moderno? (n.d.). VEJA. Retrieved April 7, 2023, from https://veja.abril.com.br/ciencia/por-que-o-concreto-romano-e-mais-resistente-do-que-o-moderno/

Como o CONCRETO é fantástico. (n.d.). Www.youtube.com. Retrieved April 7, 2023, from https://www.youtube.com/watch?v=qCjby0FC9IM

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